
Amauri Nolasco
Sanches Junior
Duas coisas me chamaram atenção e me fizeram escrever esse
texto: uma é que o ser humano está transformando o outro em mero objeto. Depois
é a ideia que nós filósofos não temos essa aptidão de ter relações, porque
analisamos a vida muito além do que o ser humano comum. Eu não posso, por
exemplo, enxergar o ser humano e seus defeitos, como o outro idealiza e nem
posso “fechar meus olhos” por causa da não ofensa. A questão vai muito além do
que aquilo que emerge do senso comum. Portanto, um cara que não foi ético, seja
quem for, é um cara que não foi ético e ponto. Filósofos tem a tendência de
serem como “moscas” ou cachorros no caso dos cínicos, a encherem o saco para
fazer o ser humano sair desse mundo no qual ele vive, nem todos conseguem ou
aguentam o “Palácio de Cristal” ruir.
Esse Palácio de Cristal é um palácio idealizado e construído
durante o reinado da rainha Vitoria do Reino Unido – na verdade, quem construiu
foi o seu consorte Albert – para mostrar o que a humanidade tem de melhor entre
o artesanato (manual) e o industrial (maquinário). Acontece, que o escritor
russo Dostoievsky, não acreditava muito nessa ideia de “mundo melhor” e de uma
humanidade que constrói e tem ideias nobres. Os artigos publicados numa
revista, vieram a ser transformado no livro “Memórias do Subsolo”, onde ele
coloca tudo de ruim humano na boca de um burocrata revoltado. Assim, quando você
diz que você derrubou o palácio ou castelo de cristal de alguém, você está
acabando com a idealização de uma ideia daquela pessoa de um “mundo perfeito”. Acontece
que não existe mundo perfeito, acontece que não existe um relacionamento sem ao
menos, sinceridade. Mas o que é a verdade? O que é a ética e no que isso
implica na realidade?
Quando falamos da verdade, estamos falando da realidade e a
realidade não tem padronização, porém, existem termos que podemos classificar
os objetos. A realidade nem sempre é os termos e tudo aquilo que enxergamos, às
vezes, tudo aquilo que vimos são realidades condicionadas dentro de uma ótica
social. Um grande argumento, melhor de todos, é o argumento do Mito da Caverna platônico,
que seres humanos estão acorrentados dentro de uma caverna escura desde seu
nascimento. Esses seres humanos estavam virados em uma parede vendo sombras,
essas sombras vinham de um fogo atrás desses humanos e na parede, onde olhavam,
estavam sombras que todos tinham como realidade. A realidade era incorporada em
sombras por toda a vida desses humanos, mas eram apenas, outros seres humanos
carregando objetos para fins diversos (Platão não deixou claro). Por razões desconhecidas,
um desses seres humanos se soltou dessas correntes e encontra a saída dessa
caverna, que quando sai encontra uma luz muito forte, que o cega por um
momento, mas logo se acostuma com ela vê uma outra realidade. Só que ele vê flores,
vê os insetos, vê os animais e vê o Sol sem artificio de chamas ou algo desse
tipo e encontra uma outra realidade. Esse ser humano volta e quer livrar os
outros dessas correntes, esses seres humanos rirem dele e diz que está louco,
de tanto insistir, os que estão na caverna o matam.
Claramente, Platão descreve o filósofo, aquele que sai da
realidade de todos e nos diz que a realidade é muito mais do que isso e é morto
ou esquecido por razões obvias. Vamos a um exemplo prático, uma colega lhe pede
um conselho, você é um filósofo, você não pode ir contra aos seus princípios
éticos, aí ela te pergunta sobre presentes de um ex-namorado que lhe traiu, que
lhe magoou, que jogou literalmente, ela na poça da lama. Você diz um “legal”,
como se você não soubesse onde essa história dará – para mim traiu uma vez, não
para por aí não, mas tudo bem – aí ela te acusa de menosprezar o cara por você ser
escritor e o cara é personal-bombado, não é poeta, não é nada além de um
pequeno pedaço de carne em pé. Ela desfaz a amizade e diz que você pode pensar
o que você quiser. Claro, isso é uma história para ilustrar como estamos a todo
o momento “armados” e que, um filósofo de verdade, pode derrubar o “castelo de
cristal” da princesa que não pode ser contrariada. E é obvio que um filósofo pensa
o que ele quiser, ele não precisa de “castelos de cristal” para se apresentar, ou
para se manter, ele é “amigo da sabedoria” e não pode ficar presos em mazelas.
Quando nos deparamos não com a realidade que estamos presos,
mas com a realidade de fato, a essência do “cogito” – que Descartes vai mostrar
em “penso, logo eu existo” – onde nos deparamos com nossa própria existência,
nós podemos ver, que há uma ética dentro da realidade. Daí as coisas fazem um
pouco de sentido, porque você não é mais convencido pelos outros, você é
convencido por você mesmo. Voltando a nossa colega, ao invés de ficar “nervosinha”
conosco, poderia parar e pensar além das aparências (Platão ever). Por que dos
presentes? Por que insiste tanto com ela e porque traiu? A nossa colega iria
chegar a mesma conclusão do cara que saiu da caverna, a luz vai ofuscar a sua visão
(a confusão), vai ver que o cara está te enrolando, irá ver que uma relação é
feita de um contrato e esse contrato é mantido na ética. É muito melhor ser ético,
você não tem que esconder nada, você não tem que tomar cuidado no seu Facebook,
você nem se importa com suas redes sociais. Como diz um ditado popular: você pode
não acreditar, mas presta a atenção.
Na essência criamos uma geração “mimada” que não aguenta
dorzinha nenhuma, como se o mundo fosse o que eles querem que seja. A Alice
sempre sai do “país das maravilhas”, porque não existe mundo melhor ou pior,
aliás, o mundo e o universo não estão nem aí com você. Eu sou um cara prático e
cético, eu não acredito em “carne fraca”, “castelos de cristal” e nem “mundo
melhor”, pois, o mundo e a realidade somos nós que fazemos. Se você acredita em
buda, não há muita diferença com a filosofia platônica, que a realidade é construída
com o conhecimento, que se você trai a si mesmo, não será diferente do outro.
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