
«A palavra
'Cristianismo' é um equívoco - no fundo existiu somente um único cristão e esse
morreu na cruz. O 'Evangelho' morreu na cruz. » [Nietzsche, O Anticristo, § 39.
°]
Nunca fui uma pessoa que não acreditasse em uma divindade,
mas não tenho uma crença cega. Ao meu ver, inventaram uma doutrina em cima dos
ensinamentos de Jesus e inventaram sua própria metafisica, que aliás, não era a
mínima metafisica que Aristóteles projetou para si mesmo, uma metafisica para o
consolo daqueles que eram ressentidos com sua vida. Na verdade, Roma dominou o
mundo mais uma vez com sua própria metafisica cínica, não de Diógenes (o
cínico) ou seu mestre Antístenes que era discípulo de Sócrates, mas o cinismo
de pessoas cultas que deixaram uma doutrina seria e espiritualizada em mero
escarnio estoico daquilo que foi o judaísmo messiânico. Como disse o filósofo
Nietzsche, o único cristão morreu na cruz porque ninguém quis seguir sua
doutrina verdadeiramente, mas colocaram sua própria e quando colocaram sua
própria, a divinização e toda a espiritualidade ali contida, foi quebrada no
mesmo modo que dizem Adão fez comendo o fruto do pecado (só essa parte do
Gênesis daria um capítulo de um livro inteiro). Mas os fatos estão aí:
deturbaram a espiritualidade jesuítica para garantir sua própria soberania
junto aos povos ressentidos contra Roma, que sem eles perceberem, dominaram
eles sem armas e sem morte, mas apenas, a morte espiritual.
O que a cantora gospel Ana Paula Valadão disse não me
surpreende, porque a própria psicologia tem dito que criticamos aquilo que
somos, criticamos aquilo que nos incomoda. Posso, sem medo de errar por ser
publicitário, dizer que esse boicote ao comercial da C&A é dar poder aonde
não se tem nenhum poder, pois, quem é homossexual não foi influenciado por nada
e sim, nasceu com isso dentro de si mesmo. Primeiro vamos ao comercial: pessoas
correndo nuas num campo (ao que parece, são casais) e mulheres vestem roupas de
homem e homens vestem roupas de mulheres e correm ao que é um abismo, lá em
baixo está roupas como se fossem estandartes (bandeiras de guerra). Na verdade,
se fomos interpretar a fundo, quer dizer que somos iguais e não são roupas que
nos define, lá em baixo do abismo (quando olhamos de cima) estão os estandartes
de guerra que são da guerra de gêneros. E ao meu ver, não ataca a família
tradicional (com os amantes e tudo), isso apenas questiona a imposição social
do que é para a menina e o que é para menino e nada vai abalar nada, só é uma
outra maneira de enxergar o que é habitual e não o que realmente é. Vários
cantores de rock tem uma postura desse porte e são muito bem casados, como o
vocalista do Twistter Sister que começou vestindo as roupas da namorada que acabou
sendo sua esposa. Essas pessoas questionaram o posicionamento do macho-alfa que
manda, que as vezes, abusa da sua autoridade para bater na mulher ou nos
filhos. As pessoas têm que se sentir homens e mulheres para si mesmo, tem que
se tornar homens e mulheres para si mesmo e não porque a sociedade quer ou
exige, pois, cada um faça da sua vida o que quiser e o caminho da salvação, não
é por essas falácias que vamos trilhar o caminho verdadeiro.
Como disse no começo do texto, colocaram dentro da doutrina de
Jesus uma metafisica que não existe e muito pior, colocaram a mesma moral
judaica que ele repudiava. Jesus mesmo disse que o que sai da boca no homem é
muito mais prejudicial, do que o que entra da boca do homem mencionando a lei
judaica de comer porcos e que não faz o menor sentido. O que o espiritualismo
tem a ver com o que você come? O que Deus tem a ver é com o que você age para
seu próprio crescimento e seu caminho até o cume da evolução – que para nós é
um mistério – porque é muito mais do que essas resoluções morais meramente
humanas. Poderíamos chegar a cantora e perguntar: quem é a pessoa que se
encontra encarnada em uma cantora gospel? Ora, ela poderia responder ser uma
mulher que é cristã e louva a Deus. Primeiro temos que definir o que é cristão
para depois definir o que é louvar a Deus (aliás, não gosto muito do termo Deus
por ser usado muito aleatoriamente).
O termo cristão é derivado do termo Cristo que tem uma longa
tradição de significado, que ao longo da história do cristianismo, foi se adaptando
ao que está escrito dentro do evangelho (mais precisamente, no novo
testamento). Na verdade, o nome Jesus Cristo não é o verdadeiro nome de Jesus e
sim, um título que deram ao mestre igual ao que deram ao príncipe Gautama
chamando ele de Buda (o iluminado). Cristo vem do latim “christus” que por sua
vez deriva do termo grego “khristós”, mas segundo diz a tradição, os evangelhos
foram escritos em grego e assim, o termo “khristós” quer dizer o “ungido”. E o
termo “ungido” deriva do hebraico “mashiach” que quer dizer “messias” e assim
sendo, esse termo Cristo acaba sendo “Messias” ou se preferir, Jesus o messias.
Na verdade, todo esse significado foi (como disse lá em cima), uma romanização
daquilo que era um judaísmo messiânico, ou seja, havia um judaísmo tradicional
mosaico que seguia todas as designações de Moisés e existia um judaísmo que
seguia os desígnios de Jesus (Yeshua) que por ele ser chamado de “o ungido” ou
“o messias” ficou messiânico. Só quando Roma começa a se cristianizar, começa a
criar sua própria teologia e metafisica (que muitas vezes, não existiu dentro
dos evangelhos), se começa a se chama Jesus Cristo. Na realidade, seus
discípulos o chamavam de rabi (mestre) e na época, não existia o nome. Então,
mesmo se você for protestante, você usa uma designação teológica de Roma, pois,
ser cristão não é a pura essência dos ensinamentos de Jesus e sim, uma
metafisica teológica construída para o convencimento da maioria que eram
pessoas humildes que tinham um ressentimento de viver na pobreza, viver na
miséria e não tinha explicação nenhuma o porquê dessa miséria. Muitas vezes,
esse convencimento era forçado e tinham obrigatoriamente que acreditar na
igreja e não nos seus próprios questionamentos. Se alguém perguntasse: se Deus
é bom, por que nasci assim tão pobre? Um padre poderia responder que era
designo de Deus e que a sua alma iria ser salva.
Mas havia um porem: como poderíamos ser salvos se somos
eternos pecadores? Lembrando sempre que ser pecador é estar em falta com Deus
em atos ou pensamentos, se você pensar em coisas luxuosas eram coisas
pecaminosas, se fizesse coisas que iriam contra os desígnios do divino, iriam
todos queimar no inferno (na verdade esse inimigo teve que ser construído para
melhor construir uma contrapartida da salvação e para explicar o mal). Até hoje
se você quiser ser salvo você tem que ir à igreja (do grego ekklesias que quer
dizer comunidade), e louvar a Deus para ser salvo e você se redimir dos seus
pecados. Se a criança nasceu naquele momento em que ela pecou? Vão dizer que é
herança de Adão, mas se fomos ir além, Jesus anula todo pecado do mundo
morrendo por todos. Não é assim que diz a teologia? Então por que a criança,
eu, os outros seres humanos, tem pecado ainda? Porque temos que ainda louvar o
nome de Deus para ele nos perdoar e isso só pode ser feito numa igreja e diante
um sacerdote, com uma pregação e todo um ritual, que só faz ser um ritual para
religar nós a Deus. Mas por que devo louvar a Deus, se Deus é o próprio louvor?
Sim, se fomos analisar na essência, o termo “louvar” tem o significado de
glorificar, elevar, enaltecer, pois, enaltecemos o nome de Deus nas alturas.
Mas Deus já é a glorificação da criação, aliás, o termo “Deus” nem pode
explicar a natureza de uma consciência além do tempo, além da realidade e a
matéria, pois, não podemos dizer “quem é Deus”, porque Deus não pode ter
personalidade, nem dizer “o que é Deus”, porque Deus não pode ser um objeto. O
“louvor”, nesse especifico caso, seria um termo vazio, porque você não pode
enaltecer aquilo que já é enaltecido.
Assim sendo, muitas pessoas nem sabem o que estão dizendo,
porque não questionam ou não põem a prova o que o ritual religioso está dizendo
ou pregando, apenas repetem. Assim, indo um pouco além, o que Jesus disse dessa
moral toda? Por que tanto dizem os cristãos que são a favor da família
tradicional? Há uma frase interessante de Nietzsche (que era de uma família de
pastores e estudou muito o evangelho) disse no seu livro Além do Bem e do Mal:
“Jesus disse aos seus judeus: <<A Lei era para os servos – amai a Deus
como eu o amo, na condição de seu filho! Que importa a nós, filhos de Deus, a
moral! >>”. Claro que Jesus não disse isso, é uma interpretação do
filósofo, mas uma interpretação de muitos ensinamentos de Jesus que dizia para
deixarmos tudo e seguirmos ele, não largar os objetos, e sim, largar conceitos.
Em outro vídeo a mesma cantora gospel diz que é a favor da família tradicional
(que os cristãos medievais construíram para a procriação de trabalhadores no
feudo), mas resta saber qual o conceito de família estamos falando, onde na
maioria das vezes, o homem tem várias amantes, bate na mulher, judia dos
filhos, arregaça toda a estrutura psicológica dos próprios filhos e diz ser
devoto de Jesus. O que Jesus diria a isso? Em uma passagem clássica dentro do
evangelho, mais precisamente em Mateus: “Enquanto, Jesus estava pregando à
grande multidão, do lado de fora, sua mãe e seus irmãos procuravam falar com
Ele. Então alguém o avisou: “Tua mãe e teus irmãos estão lá fora e desejam
falar-te”. Jesus, entretanto, respondeu ao que lhe trouxera a informação: “Quem
é minha mãe e quem são os meus irmãos? ” E, estendendo a mão na direção dos
discípulos, afirmou: “Eis minha mãe e meus irmãos. Pois todo aquele que faz a
vontade de meu Pai que está nos céus, este é meu irmão, minha irmã e minha mãe”.
”. A resposta de Jesus é clara, pois, a vontade do “pai” (em aramaico ábba) que
está no céu é o amor e a união. Quem arrebenta a família, quem discrimina as
outras religiões, quem discrimina o outro que é diferente, está pregando
realmente o amor? Em nenhum momento Jesus ensinou moral nenhuma, ele ensinou um
caminho para a verdadeira espiritualidade, uma verdadeira essência daquilo que
realmente o ser humano pode descobrir em si mesmo.
Eu não acredito em morais de idealismo que possam regular o
ser humano e sua sociedade, pois, temos que aceitar o mundo como ele é, aceitar
as pessoas como elas são e não é um comercial de roupas que vai mudar a cabeça de
um jovem heterossexual, não vai ser um ensinamento que vai mudar seu conceito,
mas sim, sempre melhorar o que temos de bom em nós: o amor a verdadeira
realidade.
Amauri Nolasco Sanches Jr, 40, escrito e filósofo.
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