quarta-feira, 4 de maio de 2016

Sendo didático na explicação do texto “Caso ATENDE”










Vou explicar uma certa confusão que se deu no meu artigo do“Caso ATENDE” que algumas pessoas ainda não entenderam ou entenderam que eu estive apenas criticando algumas amigas que lutam na área da sexualidade. Seria muito incoerente da minha parte um libertário ser contra que as pessoas agirem e acharem o que é melhor, mesmo que esse “melhor” não seja o que a maioria da sociedade vê como importante. A questão é que se temos que lutar pela inclusão das pessoas com deficiência e nessa luta tem que haver uma certa ordem prioritária, porque quando você lê um livro não podemos começar do segundo capitulo, sem ao menos, começar na introdução e no primeiro capítulo. É importante? Talvez para certas pessoas que não se encontraram ainda no mundo, mas que não deveria ser uma grande luta, porque como disse no outro artigo, é muito do fórum pessoal e não concordo que as pessoas devam se preocupar com isso.

Outro ponto que disseram é que eu confundi e misturei as coisas, mas acho que as pessoas não me entenderam na questão. O que é melhor fazer primeiramente? Como eu sou técnico de informática (em alguma coisa me serve esses cursos), vou colocar em formas algorítmicas: podemos começar de forma da vida, temos hoje o direito de ter uma vida e usufruir da vida que é nos dada como um direito. Se isso é verdade ou não, se temos mesmo direito a essa vida ou não, ficaria numa outra discussão que não cabe aqui, porém, alguns anos atrás não estaria aqui escrevendo esse texto e sim, internado em uma das várias entidades que existiam em muitas décadas atrás. Mas com o advento do social-nacionalismo alemão (vulgo nazismo), se repensou a questão individual que poderíamos ser respeitados como seres humanos. Então, somos seres humanos e se somos seres humanos, a priori (independente da experiência), somos inclusos dentro da sociedade e somos vistos (pelo menos, na teoria) como homens e mulheres que institivamente, tem e sentem sua sexualidade. Por isso acho desnecessário, essa coisa das pessoas com deficiência irem em busca, quase de forma sistemática, da sexualidade perdida, porque a sexualidade está em você mesmo. E não só a sexualidade, porque não somos um bando de primatas querendo copular um com o outro, porque não temos só o instinto e sim, uma consciência que nos remete a uma certa prioridade entre o certo e o errado. A moral não é você ser “recatado e do lar” (que é um direito, também, de cada um), mas vai dizer se o homem pode ou não tocar em uma mulher ou vice-versa, ou se aquilo vai depender de uma certa conduta ética de respeito com o outro no sentido da vontade do outro. No mesmo modo que acho que ninguém deve ser “recatada e do lar” numa forma engessada, os outros também não tem obrigação de ser “devasso e da rua” como forma de quebrar tabu, pois, certos tabus são necessários para nos defender de certos indivíduos que devem ter “problemas”.

Depois de sermos respeitados como seres humanos e podemos viver, temos que ter um tratamento para melhorar nossa qualidade de vida. Quem nasceu com certa deficiência, vai ter esse tratamento (se a fila das entidades andar), dês de muito novinho para reverter no máximo as sequelas dessa deficiência. No caso de quem ficou paraplégico ou tetraplégico, ou alguma outra doença como o ELA, existe o tratamento que não deixa a pessoa piorar aquilo que já está ruim. Temos esse tipo de tratamento dentro das instituições públicas ou privadas? Não. Se for público, já está “falido” e ainda, existem erros e filas intermináveis que segundo constam, não podem ser agilizadas por causa da burocracia estatal que o próprio governo faz para fazemos desistir. Fora que é lei o ESTADO comprar aparelhos para pessoas com deficiência e essa lei não funciona, não temos nem o direito de ter uma cadeira de rodas decente. Mas para chegar a esse tratamento precisamos de quê mesmo? Transporte para o responsável ter como levar a pessoa com deficiência para o tratamento, daí a importância de fiscalizarmos o transporte acessível no país inteiro, pois além do tratamento de reabilitação (no qual não concordo com o termo), ainda nos levam no lazer, na escola (educação) e no trabalho (lei de cotas). Temos transporte acessível de qualidade? Não temos no sentido de ter um treinamento adequado dos condutores ou que o transporte em si mesmo tem um certo tratamento especial, temos nas coxas e ainda acham, que estão fazendo um favor.

Se somos seres humanos que temos a capacidade da vida, percebemos o mundo e temos o direito à vida, a ter um tratamento de habilitação e no caso dos paraplégicos, de reabilitação, transporte para ir nesse tratamento, por que isso não é feito? Por que ainda insistem em não priorizar primeiro a temos uma vida, liberdade para viver e desfrutar da humanidade que temos, amenizar nossa incapacidade motora ou de outros módulos com um tratamento digno e um transporte para isso?  Poderemos transar sem uma vida para desfrutar, sem um tratamento para amenizar nossa deficiência ou transporte para ir até o local? Zumbi, torto e preso não vai transar mesmo. Mas tem mais ainda, pois, o ESTADO que vocês tanto amam (se pudessem ficariam transando com ele a vida inteira), não cumprem as próprias leis que constroem e que colocam como pseudo-prioridades dentro da sua agenda (que sabemos não ser verdade).

A verdade é que não só o serviço público de habilitação e reabilitação é mais ou menos, fraco e não tem um suporte muito rigoroso. Só a título de exemplo, se pegarmos uma AACD da vida e fazer uma crítica no sentido de análise profunda, vamos constatar que mesmo todo o nome que essa entidade tem e foi construído nesses, mais ou menos, sessenta anos, não fazem jus ao tratamento que dizem fazer. Na verdade, não fazem nem 10% daquilo que mostram no programa que comove todos vocês (a mim nem um olhar triste arrancam). Primeiramente, te olham na cara e dizem que você não vai andar (não que isso não seja verdade, mas pelo que são pagos para isso e a incompetência descomunal que temos que aguentar, deveriam nos carregar no colo), depois de nos abrir todinho, depois dão uma educação mais ou menos, uma fisioterapia mais ou menos, nos colocam para trabalhar para receber em dois e em dois meses (isso tudo com nossos pais pagando), operam nossas vistas e elas voltam como eram, nem detectam uma escoliose fácil de se ver a olho nu. Compram e entregam cadeiras de rodas de má qualidade ou nem entregam (com o dinheiro do SUS), não tem Raio X, não tem ginecologista (sendo ter urologista), não tem nem ao menos respeito com seus pacientes e ainda, acham que sem eles não vivemos. Ora, claro que eu sou o chato da história e que tudo isso eu tirei dos contos de fadas da minha cabeça e a prioridade de toda pessoa com deficiência que se prese é transar. O deficiente pode estar na cama, todo torto e nem uma cadeira de rodas para usar, não faz nada na vida para ter uma cabeça boa (porque essa coisa de Cinquenta Tons de Cinza é coisa de gente carente que tem sérios problemas psíquicos), não quer saber nem ao menos de política e das leis que tem direito, mas transar ele não abre mão. Mas nós temos que aguentar transporte de quinta, médicos de quinta categoria, uma cidade porcaria sem nenhuma calçada acessível, pessoas na cama com dor porque as entidades do naipe de uma AACD têm muito papo e pouca ação e as pessoas preocupadas com exposições eróticas (que nem sabem de onde vem o termo), querem saber das paraolimpíadas e numa porcaria de guerra política que eu não vejo diferença nenhuma entre esquerda e direita. Calma que não acabou.

Se temos o direito de nascer, se temos o direito de ter um tratamento de saúde, de habilitação e reabilitação e transporte para isso, transporte de qualidade, temos direito a educação. Educação é um direito básico de todo ser humano – pelo menos assim diz a ONU – onde a criança tem o direito de ser inserida dentro da sociedade e conhecer a cultura da comunidade e seus ancestrais ensinaram ao longo dos séculos. Se pensamos muito intimamente, sem ideologias inúteis e religiões que nada acrescentaram o ocidente, toda cultura que temos vem da necessidade de criar aprendizados para melhor vivemos dentro dessa mesma sociedade. Ora, se temos o direito de sermos vistos como seres humanos (nosso DNA é 100% humano, garanto), por que raios não podemos estudar em uma escola regular com as outras crianças? Porque sem a educação – porque acharam que deveríamos ter cotas para trabalhar e não para estudar, isso remete a incompetência de alguns movimentos – não teremos como ser aptos aos trabalhos e a lei de cotas, será inútil. Porém, quem não quer seu filho educado? Quem não ser conhecer e participar do momento histórico? Mas num país que um Museu da Inclusão só abre de semana, num país que acha que pessoas com deficiência é boa para receber benefício, ser no máximo telemarketing, ser palhaço de circo ou algo desse gênero, pensa que não queremos estudar e não temos que estudar, porque se escrevem tantas bobagens nas redes sociais, devem estar felizes. Rirem da condição mais deprimente que se encontram, então, dane-se se ganham essa miséria. É a decadência de um sujeito que pensa, somos decadentes ao ponto de ser otimista por causa de coisas que não temos, coisas que não vamos lutar, coisas que não priorizamos. Ali no chão pisaram num deficiente, limpe os sapatos.

Temos o direito à vida, direito a saúde, direito a transporte, direito de ir e vir, direito a educação, agora, temos o direito ao trabalho digno. Já que nascemos, já que aguentamos inúmeras operações e fisioterapias, já que estudamos e aguentamos professores reclamando de salário e que não sabem lhe dar conosco, nada melhor que, ter o direito de trabalhar e ter seu próprio dinheiro para fazer o que quisermos. Como poderemos viajar para as praias acessíveis? Como fazemos para comprar nosso próprio carro? Como fazemos para comprar camisinha para transar? Como faremos para comprar nossa própria cadeira de rodas? Como fazemos para convidar o novinho ou a novinha para a lanchonete? Primeiro é saber que você está vivo, segundo é que você venceu os médicos chatos da AACD e que te arrumaram mais ou menos (em alguns casos, pioraram muito), depois que você estudou pra caramba, depois que você fez aquele TCC que deixou você pior que o Jon Snow no final da 5º temporada do Game of Throne, e o principal, trabalhar. Aristóteles, assim dizem, dizia que era melhor dar um oficio para os “inválidos” do que o governo sustentar. Ele tem razão, mas o empresário brasileiro não pensa aristotelicamente, pensa muito utilitariamente, se o cara está numa cadeira de rodas, então, ele não funciona. Querem deficiente que anda bem, que escuta bem, que fala bem, tenha boa aparência, tenha uma boa habilidade e o principal, tenha experiência. Se o Sr Paulo Skaf explicar como se consegue experiência sem a menor noção o que é trabalhar eu agradeço, pois deve ter algum segredo secreto para ser experiente já na universidade. Claro, nós pessoas com deficiência somos muito mais cobrados do que os outros, pois, somos os “heróis da superação”.

Agora entenderam que uma coisa está ligada a outra? Não dá para pensar em sexualidade sem o direito à vida, sem o direito a saúde e habilitação e reabilitação, sem transporte, sem educação e sem trabalho. Todos esses itens são itens que dignificam o homem e mais incluem o ser humano a ser e se sentir ser humano. A sexualidade é um outro aspecto de identificação como uma identificação de responsabilidade e respeito ao companheiro, mas não pode ser caracterizado como um meio a inclusão. Aliás, o esporte que é tão cultuado no nosso meio não pode ser um fim, pois, nem todo mundo pode fazer esporte, nem todo mundo quer fazer esporte. Quem lembra de escritores com deficiência? Quem lembra de pessoas que fazem diferença a não ser no esporte? Temos poetas com deficiência, temos escritores com deficiência, deputados com deficiência, temos professores com deficiência, entre outras coisas, que nesse século superamos, mas há um apelo ainda, no requisito físico. Parece que as pessoas com deficiência têm uma grande necessidade de fazer só esporte e só pensar em transar, só olhar nos grupos desse porte, fotos, procura, identificação, mas não há meios se você se sente vazio, você se sentir um nadinha coisa nenhuma. Quem vai olhar para o nada? Quem vai olhar para pessoas que pedem desculpas para pedra que tropeçaram?

Enquanto isso, vans capotam ou batem, pessoas ficam de cama, pessoas não tem cadeiras de rodas para andarem, não existe uma ordem dentro da agenda dos movimentos e ongs, há o que achamos o certo e deixamos a coisa rolar que não é assim. Fora que alguns paladinos da inclusão já estão escrevendo inglês, espanhol, alemão, francês e só falta escrever em português, estudar e virar gente senão, o segmento das pessoas com deficiência vai estagnar em promessas vazias e não quero ficar em promessas vazias, sinto muito.

Tomem vergonha na cara e leiam coisa de verdade, uma história de um casal como vocês, O Caminho.


Amauri Nolasco Sanches Jr, 40, escritor e filósofo. 

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