Por Amauri Nolasco
Sanches Junior
Quem nunca assistiu o desenho animado “Mundo Fantástico de
Bob”? É a história de um menino (no caso, Bob), que enxerga o mundo adulto como
se fosse o que ele imagina, sempre com soluções fantásticas de um menino de
seus, 5 anos. O desenho mostra como nós, os adultos, vemos as coisas de um
outro prisma diferente de um menino de seus 5 anos de idade. Nada tenho contra
a imaginação dos meninos e meninas de 5 anos, que as vezes, nos falta em certas
situações (no Facebook está cheio de frustrado e gente que não tem a menor
imaginação de transcender essa realidade chata de um cotidiano medíocre). Não é
isso: é construir mundos que não existem na realidade dentro das “desculpas” e
“álibis”, que querem empurrar para cima do segmento das pessoas com
deficiência. O “Mito da Qualificação” é um deles.
Você pode pensar que meu modo de ver pode ser diferente do
Bob, mas não é muito. Na verdade, quando trabalhamos com idealizações não temos
a capacidade de ver a realidade e não a “realidade inventada”. A ideia é
simples, a realidade é o que mostra os fatos e os fatos nem sempre, ou não são mesmo,
eternos. Se no mundo antigo se matava pessoas com algum tipo de deficiência,
hoje, temos os Direitos humanos para garantir a vida e autonomia das pessoas
com algum tipo de deficiência. Porque hoje se tem tecnologias melhores, se tem uma
maior variedade de tratamentos, uma variedade de resoluções que não deixa isso
acontecer (menos nos países que os radicais mulçumanos estão no governo). Mesmo
assim, como um cético que sou, isso não passa de mito e os mitos são fabricados
para acreditarmos em tudo isso. Pelo menos no Brasil, num modo bem fisiológico,
existem pessoas que não tem uma cadeira de rodas, não tem uma muleta, não tem qualquer
possibilidade de autonomia de uma vida digna. Vocês acham que as mulheres com deficiência
não sofrem abuso sexual, abuso psicológico, abusos não diferentes, dos abusos
que sofrem todas as mulheres? Se vocês acham que não, vocês são como todo ser
humano, acreditaram nos mitos que se espalham a séculos. Como disse nos outros
textos, um mito não é uma mentira, um mito é uma ficção para coagir e fazer
acreditar em coisas que não existem de verdade. Na realidade, vamos ser
sinceros até consigo mesmo, ainda somos os mesmos caçadores-coletores de antes,
nossos genes não tiveram tempo ainda de mudar para uma outra fase. Ou seja, ainda
achamos que as pessoas idosas e as pessoas com alguma deficiência, atrapalha a
sociedade, a única diferença, é que no viés cristão, todos são iguais. Mas é um
mito, apenas.
Numa realidade nua e crua, num modo bem nietzschiano, a vida
não tem sentido nenhum e não temos nada de iguais. Eu posso gostar de comer num
lugar, minha noiva, pode gostar de comer em outro lugar, porque os gostos são diferentes
e essa diferença é marcante dentro da consciência do homo sapiens. Quando digo que somos caçadores-coletores, além do
modo de desenvolver os preconceitos e discriminações – o preconceito é uma
pré-ideia que se torna um mito e a discriminação é o ato de rejeitar graças a
essa ideia do pré-conceito – também tem o fato de criarmos mitos como
capitalismo e socialismo, criarmos o mito monárquico (que a milênios vem
assombrando o ser humano), porque vivíamos com pouco mais de 150 pessoas por
bando. Mais do que isso, só inventando mitos para segurar as vontades da
maioria, porque a maioria não convive com mais do que isso. Se o intuito do ser
humano, como espécie, é evoluir, então tiveram um erro crasso de serem
agricultores e isso é evidente. Mas, já que o erro foi feito, vamos analisar
mais a fundo.
O Mito da Qualificação vem junto do Mito da Ciência e do
academismo moderno. Nietzsche já no século 19, tinha nos alertado que o ser
humano iria deixar de acreditar em forças divinas e iria colocar toda essa esperança
de salvação, na ciência. Se na idade média, e depois até o século 18 mais ou
menos, nós humanos, acreditávamos na Graça Divina para a redenção da raça
humana, a “graça” para a modernidade é a ciência e junto dela, a tecnologia. Mas
já faz um tempo, que venho escrevendo, que a tecnologia nos últimos 70 anos, avançou
muito mais rápido do que a nossa evolução ética e moral. A tecnologia pode ser
usada para aprendizados, dar uma vida mais digna as pessoas com alguma deficiência,
mas pode ser uma arma mortal para pessoas que querem fazer maldade. No mesmo
modo que construíram o telescópio Hubble, os norte-americanos, construíram duas
bombas atômicas e testaram no Japão. Pois, a verdade é, que os yankes pouco
estavam ligando para o mundo.
Isso poderia ser uma redenção de sairmos da ignorância e
entrarmos na era do conhecimento, a era onde o ser humano poderia se conectar a
todos os seres humanos no mundo todo. Isso é um mito, pois nem todo mundo troca
informação nenhuma e sim, trazemos o cotidiano cultural para as redes sociais. A
ciência pode ter nos dados cadeiras de rodas melhores (outras adaptações diversas
também), mas nos obrigou a se adequar a um academismo que nem sempre, temos condições
de pagar ou, conforme o cargo, precisão para isso. O academismo, na verdade,
foi uma exigência governamental sob pressão dos industriais de se adequar a
ideia do conhecimento como base de alguns cargos. Um filósofo, por exemplo,
pode muito bem ser um filósofo sem precisar de um diploma, mas o governo (o
ESTADO), quer ensinar os mitos que um filósofo deve pensar ser verdade. Daí sai
baboseiras imensas que filósofo não pode xingar, que filósofo tem que defender uma
posição, que filósofo tem que ser ateu e cético. Mas, bem da verdade, um filósofo
é avesso a tudo isso e fico imaginando se Sócrates não iria rir dos filósofos de
hoje, medíocres e chatos.
Daí, quando se faz uma lei como a lei de cotas – que faz as
empresas darem uma porcentagem de vagas as pessoas com deficiência – se esquecem
das mesmas resoluções que tomaram no passado, só trabalha quem tem qualificação
profissional. Acontece que isso a uns 15
anos atrás – quando a lei tinha uns 10 anos – poderia até “colar” como uma
desculpa das empresas de não quererem se adaptar para tal, mas hoje, com muitas
pessoas com deficiência qualificadas, é difícil querer convencer pessoas que não
estudaram segurando seus diplomas. Mas eu estou muito mais preocupado em
analisar atos éticos (de caráter), do que morais (de costumes) e digo com
bastante vigor, há de analisar a Lei de Cotas num viés de caráter daqueles que não
querem contratar e usar o meio governamental, para dar a “desculpa” da “qualificação”.
Será mesmo que o problema aí é mesmo a “qualificação”? Alguém já parou para
pensar que o problema não é a “qualificação”, mas a nossa própria biologia de
ainda rejeitar aquilo que atrapalha o bando? Mas, claro, as revistas e os “exemplos
de superação” podem argumentar comigo: “Ah Amauri, existem pessoas
conscientizadas que contratam pessoas com deficiência sem mesmo, pedirmos! ”. Tá
ok. Senta lá “Claudia” que o tio vai explicar uma coisa de uma maneira bem
adulta, ok?
Quem contrata pessoas com deficiência são de duas categorias
apenas (mais do que isso, passa a ser idealização): A primeira categoria é quem tem exemplos de deficiência
em casa ou tem algum parente, porque se não for assim, não existe ninguém que
convença uma pessoa que uma deficiente pode ser um bom profissional. Outra categoria
e por indicação de alguém dentro da empresa, assim, as coisas são o que são sem
hipocrisia. O “jeitinho” sempre se virou, até mesmo, quando se trata da lei de
cotas. Num viés ético (até mesmo do caráter aristotélico), ou uma lei deve ser
cumprida ou ela não existe, porque se um empresário tem um monte de direitos,
ele também tem um monte de deveres diante a sociedade de fazer a economia
rodar. Esse direito e dever tem muito a ver, com o caráter de cada um, não só do
mais necessitado. O empresário não está acima da cidadania, ele é cidadão como
todo mundo, se existe leis e tem uma conduta ética dentro dessa lei, deve ser
cumprido. Então, não adianta revistas mostrarem um “fantástico mundo” que a
mim, não convence e colunistas que faltam com a verdade, pois, quando você sabe
da verdade e começa a camuflar por motivos diversos (os anúncios dessas
revistas, vem do empresariado), começo a achar que estou sendo enganado.
O que tem de errado nisso? Nada. Um desenvolvimento humano
passa pela idealização e o mito, mas quando isso atrapalha enxergar a
realidade, isso vira alienação. Como diz a música do conjunto Camisa de Vênus: “Não
há mais festas, nem carnaval/acho que fui enganado! ”.
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