sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Escrever cadeirante ou pessoa com cadeira?



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Por Amauri Nolasco Sanches Junior

Sempre achamos que temos o direito de inventar termos para esconder traumas e frustrações de si para amenizar aquilo que só incomoda você mesmo. O que incomoda você mesmo? O fato de não ser o que você espera que seja que você deveria ser, que de fato, você não é e não vai mudar o fato se chamando de pessoa com deficiência ao invés de deficiente. O fato que você adquirir a sua deficiência, ou mais ainda, nascer com a deficiência, não muda o fato de você ser um deficiente e ponto. Isso é acometido porque as pessoas são tão acomodadas que não estudam as etimologias das palavras, sua origem e o porquê é usado tais palavras. Por outro lado, muitas pessoas ficam preocupadas com termos que esquecem das importantes medidas de inclusão, medidas esta não respeitadas ainda na nossa nação e deveriam ser muito mais priorizadas.

A grosso modo, vamos pegar termos que nós (pessoas normais e que não temos traumas nenhum), temos que escrever para não irritar o “segmento”, como se fossemos unidos assim. Quando escrevemos “pessoas com deficiência”, para substituir “deficiente”, não basta achar que isso vai tirar o estereotipo da deficiência além da pessoa. Bom, se pegarmos o termo “pessoa” vamos ver que etimologicamente, pessoa é um termo que foi construído do termo latim “persona” que eram mascaras romanas que eram trocadas conforme o personagem encenado (na maioria, eram apenas 3 atores e homens). Desse termo, além de pessoa, foi construído personagem e personalidade, ou seja, personagem é aquilo que se encena ou se lê num livro, que faz o enredo de uma história. Existe o personagem histórico (que existiu verdadeiramente) e o personagem de ficção (que não existiu de verdade). Personalidade, é o que você é realmente, é o que somos e construirmos ao longo da nossa história social. Então, pessoa tem dois lados no escopo social: personagem enquanto um ser que está inserido na história humana, assim, um ser que existe e é atuante (mesmo que nós não fomos inseridos no livro de história); e ao mesmo tempo, temos nossa personalidade enquanto ser individual e que construiu toda uma história dentro da sociedade. Ora, se o “inteligentinho” com deficiência acha que isso vai mudar o fato das pessoas se conscientizar pela inclusão, vai se frustrar muito com isso, porque vão continuar sentando no banco preferencial, vão sempre achar que tem direito de parar na vaga preferencial, entre outras coisas.

Continuando, vamos analisar o termo “deficiência”, onde há certas confusões. Deficiência vem do latim “deficiens”, esse termo veio do verbo “deficiere” que quer dizer “desertar, revoltar-se, falhar”, de “DE” (fora) com “FACERE” (fazer, realizar). A grosso modo é um movimento que NÃO realiza, porque o “DE” nesse caso é um termo de negação e nesse caso específico, ele está negando a realização de uma função. Mas da mesma família veio também “deficiente” que é um ser falho, um ser que não tem as faculdades de suas funções normais daquilo que se padronizou como o que seria uma função normal. Não estou dizendo que é certo, mas estou dizendo que tem a mesma função etimológica. Portanto, tanto deficiente como pessoa com deficiência, são personalidades que não tem suas funções normalizadas, falham em suas funções. Mas isso não quer dizer, que fique bem claro, que não somos seres humanos em nossa totalidade humana entre corpo e alma. Eu só demostrei que é a mesmíssima coisa, que temos que assumir as nossas falhas e adaptarmos da melhor maneira possível a vida.

Mas também, pessoa com deficiência tem uma estética muito mais universalista, porque separa o sujeito do predicado, então, você consegue só complementar o predicado. Como: pessoa com deficiência física, pessoa com deficiência mental, pessoa com deficiência sensorial e por aí vai. Só que é muito chato você ficar se policiando para escrever pessoa com deficiência ao invés de deficiente – que é muito melhor esteticamente – porque os “politicamente corretos” assim querem que nós façamos, que na essência, quer dizer a mesma coisa. Um ser que é um personagem histórico e é uma personalidade social, que na sua totalidade, é uma pessoa e vive e é tudo que uma sociedade faz de qualquer pessoa. Não se pensa e não pode se pensar, que só porque ele é falho em algumas funções, que ele não tem desejos, não tem sentimentos, não tem preferência, não tem sua própria opinião (é uma falácia que o deficiente não tem opinião, ele tem, mas é bunda mole muitas vezes), não tem beleza e qualidade, tem até pessoas, que acham que não temos diploma.

Tudo que escrevi – que não foi pouco – foi para demonstrar que para se formar um termo, tem que se estudar a forma estética, tem que estudar a linguística, tem que se estudar até a etimologia de uma palavra. Não basta achar que vai criar linguagens e sintaxes novas, uma sintaxe nova é muito difícil para ser feita e refeita. Como por exemplo, você colocar a preposição “COM” no meio de um termo desses, que por bizarrice, dará a colocação muito mais destacada da deficiência do que se somos chamados de deficientes. Pessoas são personalidades, deficiências são falhas, logo, personalidades com falhas. Entendeu agora? Entendeu como é muito mais humano chamar uma pessoa de deficiente como outros países fazem? Conseguiram enxergar que as pessoas não querem proteções conceptuais furadas?

Quando chamamos um cadeirante de cadeirante – aqui não interessa quem inventou o termo – nós já especificamos que são pessoas que necessitam de cadeira de rodas. Agora, quando começamos a inventar muito, os termos se perdem e começamos a errar a sintaxe, a terminologia, a estética e a etimologia. Ao invés de dizemos cadeirante, agora, inventaram um tal de “pessoa com cadeira”, para dizerem que são contra o termo “cadeirante”. Bom, você diz assim: “existem necessidade de se construir rampas para os cadeirantes”, ótimo, você estará especificando uma ala dos deficientes que precisam de uma rampa para subir. Ou eu digo que sou um cadeirante, que me dará um certo destaque a minha deficiência especifica que precisa de uma cadeira de rodas. Tanto pessoa, quanto cadeira de rodas, já estará contido no cadeirante e não pode ser separado por ficar esteticamente, difícil de pronunciar e num tato esquisito. Porque deixa um vácuo, digamos, muito estranho, como pessoa com cadeira. Podemos perguntar: que cadeira? Pois deficiência tem uma característica particular, mas cadeira é muito universal e não é especifico. Quem incentiva esse tipo de mudança, porque deficiente não faz esse tipo de coisa sozinho porque não se preocupa com nada, na maioria das vezes, ou é péssimo em português ou simplesmente, tem sérios problemas neurológicos e eu tenho medo dessas pessoas.


Mas voltando a pergunta “que cadeira? ”, podemos afirmar que não existe nada que me leve a pensar que a cadeira é algo especifico como cadeira de rodas. Não há harmonia estética no termo. Você pode escrever pessoa com deficiência muito facilmente, mas você nunca poderá escrever pessoa com cadeira sem ter uma desarmonia estética que por um lado, não existe uma simplificação do termo, não existe uma complementação e outra coisa, haja saco você ficar escrevendo “pessoa com cadeira de rodas”. Agora, há sim prioridade como acessibilidade, como a adaptação de transporte, existe também, que a leis sejam cumpridas. Eu sou cadeirante deficiente, isso não resta dúvida nenhuma. 


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